por Marco Alevato para Facebrasil News
Orlando, com seu clima ensolarado, custo de vida relativamente acessível e a força do turismo, tornou-se o destino preferido de muitos brasileiros seja para férias, investimentos ou mudança definitiva. No entanto, um fenômeno tem preocupado a comunidade: os altos índices de problemas envolvendo a compra de carros usados.
Entre histórias de carros com histórico de acidentes não revelados, problemas mecânicos graves e golpes por parte de vendedores sem ética, o que deveria ser uma experiência positiva muitas vezes acaba em frustração e prejuízo financeiro.
A origem dos carros: leilões e riscos ocultos
Grande parte dos carros usados vendidos em Orlando, inclusive por revendedores brasileiros, é adquirida em grandes leilões automotivos, como os das redes Manheim e Copart, que movimentam milhares de veículos por semana em todo o país.
Nesses leilões, os carros são vendidos em seu estado atual, muitas vezes com pouca ou nenhuma garantia, e incluem desde modelos com baixa quilometragem até veículos danificados, recuperados de enchentes ou com histórico de perda total (total loss).
Revendedores experientes podem encontrar boas oportunidades, mas também é comum que veículos com problemas graves passem por reparos cosméticos rápidos apenas para revenda.
O consumidor final, sem saber a origem do carro, muitas vezes compra um veículo que parece em bom estado, mas que pode esconder defeitos estruturais ou históricos comprometidos.
O barato que sai (muito) caro
Diferente do Brasil, o mercado de carros usados nos Estados Unidos é altamente dinâmico. Veículos trocam de dono com frequência, e a variedade de ofertas pode encantar quem chega com o sonho americano de mobilidade própria. Com valores aparentemente acessíveis, muitas vezes abaixo de US$ 10 mil, é comum que o brasileiro veja na compra de um carro usado uma solução rápida e econômica.
Porém, o que muitos não sabem é que o mercado esconde riscos. “É comum encontrarmos brasileiros que compraram carros com título ‘salvage’, sem saber o que isso significa”, relata Márcio P., mecânico brasileiro que atua há 12 anos em Kissimmee. O termo se refere a veículos que sofreram perda total por acidente, enchente ou outro dano severo, e que foram posteriormente reparados. Esses carros podem parecer impecáveis, mas trazem riscos ocultos, como falhas estruturais ou eletrônicas.
Outro problema comum é o financiamento com juros abusivos. “Muitos brasileiros recém-chegados, sem crédito estabelecido, acabam aceitando condições de financiamento com taxas superiores a 20% ao ano”, explica Paula Tavares, consultora financeira na Florida. “A empolgação da compra muitas vezes cega o consumidor.”
A barreira do idioma e a falta de informação
Boa parte dos problemas enfrentados pelos brasileiros decorre da falta de familiaridade com o sistema americano e, em muitos casos, do idioma. Contratos assinados sem total compreensão, documentos ignorados ou não conferidos, e a ausência de consultoria especializada abrem margem para situações desfavoráveis.
Conexão cultural e aparente confiança
Muitos brasileiros, ao chegarem a Orlando, optam por comprar seus carros com revendedores também brasileiros, acreditando que a afinidade cultural, o idioma em comum e a sensação de acolhimento oferecerão uma experiência mais segura e transparente.
Em alguns casos, esses revendedores realmente prestam um serviço honesto e ajudam o cliente a navegar pelas burocracias do sistema local. No entanto, essa relação de confiança nem sempre é correspondida. “A gente se sente mais à vontade negociando em português, com alguém que entende a nossa realidade. Mas nem todo conterrâneo é ético”, alerta Luciana.
A ausência de fiscalização rigorosa e a informalidade de algumas dessas empresas facilitam práticas duvidosas, como ocultação de histórico de danos, financiamento com juros altos e venda de veículos sem garantia.
A engenheira civil mineira Luciana*, por exemplo, comprou um SUV usado de uma pequena revenda próxima da Colonial Drive. “O carro parecia novo. O dono da loja era simpático e dizia que era especializado em brasileiros recém-chegados”, relata. “Mas depois de dois meses, o motor apresentou defeito e o conserto custava mais de US$ 3 mil. Descobri que o carro já tinha passado por uma enchente.”
Mesmo comprando por meio de revendas licenciadas por grandes marcas, os consumidores nem sempre estão protegidos. “Alguns dealers oferecem garantias mínimas, mas muitas vezes limitadas ao motor e transmissão, e por apenas 30 dias”, na maioria das vezes as compras são “as-is”, explica Márcio. “Nas condições que se encontra o veículo no momento”.
A ausência de inspeção técnica
Diferente de estados como Nova York ou Califórnia, a Flórida não exige inspeção técnica periódica de veículos. Isso significa que carros com problemas graves podem circular e serem vendidos legalmente. Assim, cabe ao comprador se proteger com uma inspeção independente antes da compra, algo que muitos brasileiros ignoram, seja por pressa ou economia.
Informação e cautela são as melhores aliadas
O carro é, para muitos imigrantes, o primeiro passo para a mobilidade e independência nos Estados Unidos. Mas, como alerta a comunidade brasileira em Orlando, ele também pode ser uma armadilha para quem chega despreparado. Buscar informações, contar com ajuda profissional e desconfiar de “facilidades” são atitudes fundamentais para garantir uma compra segura.
“Aqui, como em qualquer lugar do mundo, ninguém dá nada de graça. É preciso se proteger”, finaliza Paula Tavares.
Nem todo mundo é golpista: há bons revendedores brasileiros
É importante destacar que existem, sim, dealers brasileiros sérios, honestos e com excelente reputação em Orlando, que trabalham de forma transparente e oferecem veículos com garantia, histórico completo e suporte ao cliente antes, durante e depois da compra. Muitos deles se consolidaram justamente por prestarem um serviço ético e ajudarem conterrâneos a evitarem armadilhas no mercado local.
No entanto, a busca por esses profissionais deve ser feita com cautela e espírito previdente. Pesquisar avaliações online, pedir recomendações a outros brasileiros e visitar a revenda pessoalmente são passos fundamentais para não cair em promessas fáceis ou aparências enganosas.
7 cuidados antes de comprar um carro usado nos EUA
- Cheque o histórico do veículo (Carfax ou AutoCheck): Com o número do chassi (VIN), é possível verificar acidentes, número de donos, quilometragem real e se o título do carro é “clean”, “salvage” ou “rebuilt”.
- Faça uma inspeção com mecânico de confiança: Invista de US$ 100 a US$ 200 em uma vistoria detalhada antes de fechar o negócio. Isso pode evitar prejuízos de milhares de dólares depois.
- Desconfie de preços muito abaixo da média: Carros com preços muito atrativos podem esconder problemas graves ou títulos comprometidos.
- Verifique o status do título (Title): Nunca compre carros com título “salvage” ou “rebuilt” sem entender plenamente os riscos. Prefira veículos com título “clean”.
- Consulte as taxas e custos adicionais: Além do valor do carro, verifique impostos (sales tax), taxas de documentação, seguro e registro (DMV).
- Cuidado com o financiamento: Sem histórico de crédito nos EUA, os juros podem ser altos. Sempre peça a simulação completa e avalie a possibilidade de compra à vista.
- Prefira dealers licenciados e com boa reputação: Pesquise avaliações online (Google, Yelp, Better Business Bureau) e peça recomendações a outros brasileiros.
Até a próxima



